ÀS VEZES DÁ-ME VONTADE DE NADA
[Umberto Boccioni]
Às vezes dá-me vontade de nada.
Nada ver, nada dizer ou pensar. . .
mas se é assim, por que este escrito?
Também não sei, talvez o nada não
seja integral. Seja um quase nada,
então: pouquíssimo ver. Distinguir
na bruma do pensamento, na névoa
da consciência, com uma letargia,
uma fumaça fria, onde só
se movam, lentamente, os lagartos
à procura de rochas aquecidas
para que lá fiquem, em inação
durante longas, eternas manhãs.
E de tal modo, ausente, longínquo
nadificado na demora dos
tempos, vindo de estrelas distantes,
de pré-históricas eras ou de
profundíssimos magmas, pudesse
enfim achar-me. Só. Em meio ao vácuo.
E estas palavras? Ah! Também para nada. . .
[*Walter Cabral de Moura (1955) é de Recife, Brasil. Biólogo e analista ambiental federal. Publicou por conta própria: Brilha, Cosmos (1975) e Livro dos Silêncios (2000), ambos de poesia. Tem inédito É lenta a palavra tempo. Participou das coletâneas Fauna e Flora nos Trópicos (Fortaleza, 2003); Pernambuco, Terra da Poesia (São Paulo, 2005); Antologia de Escritas n° 4 (Lisboa, 2008). É membro da União Brasileira de Escritores - seção Pernambuco.]
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